Com preguiça de ler? Ouça o áudio AQUI. Hoje o assunto é bem sério e polêmico e eu preciso da sua atenção de forma bem lógica e racional, independentemente da forma como você cultua os Orixás.
Vamos voltar no tempo comigo e viajar na sua memória para 20 anos no passado.
Você lembra quantos Babalorixás e Iyalorixás você conhecia ?
Eram bem poucos né?
Hoje deve haver o quê?
Pelo menos umas 10 vezes mais?
Este número deveria ser motivo de alegria e esperança para todos nós filhos e devotos dos Orixás, afinal de conta quanto mais sacerdotes e casas maior é o culto aos nossos Deuses. O sentimento deveria ser orgulho, mas não é por um detalhe: A grande maioria desses(as) novos(as) Sacerdotes(isas) não estão e nem foram preparados para cuidar do bem mais precioso que temos, que é a nossa VIDA e a daqueles que amamos.
Cuidar de uma ou de várias VIDAS neste universo dos orixás, é ter intimidade com o erindilogun (jogo de búzios), ou um óráculo que de fato fale com os deuses, é conhecer profundamente pelo menos os 16 orixás mais populares no Brasil, é conhecer de ebó, é ter mãos de axé, é ter responsabilidade com as palavras, é ter liderança e saber a grande diferença entre orientar uma pessoa e aprisioná-la.
Alguns desses sacerdotes apenas cumpriram os seus 7 anos como iaô, ou seja, não tinham tanto acesso aos fundamentos e segredos, com raras exceções, e saíram loucos em busca da tão sonhada "casa própria".
Há deles que digam: “ Tenho uma ótima intuição e Exú fala no meu pé de ouvido” Não duvido. Só que também vejo isso como algo perigoso. E o resultado a gente vê aí nas centenas de depoimentos tristes e histórias de vidas e famílias destruídas pela inexperiência desses sacerdotes. Orixá não é intuição.
Sei que muitos desses sacerdotes "apressados" são aquelas pessoas cheias de sonhos, de boa vontade, de muita aspiração em fazer o certo, que querem de fato ter uma casa séria, que acreditam que nasceram com essa missão ou até mesmo a receberam de Orixá. Assim como há outros com uma vaidade enlouquecida, ambição pelo poder e uma vontade de mandar que não é brincadeira não. Só tem um único problema, por mais que haja boa vontade e gana eles não foram devidamente preparados. Preparar-se devidamente está intrínseco em qualquer tipo de sacerdócio, não há como pular etapas.
Fico aqui me perguntando, e talvez você já tenha se feito esta mesma pergunta:
Por que tanta pressa?
Por que não há a paciência para se preparar devidamente e com responsabilidade? Para que textos como este não caiam como uma perfeita carapuça. Na filosofia Iorubá a paciência é um predicado caro que edifica o sacerdote e enobrece a alma.
Esse movimento aqui no Brasil de sacerdotes despreparados já começou e não acredito que ele tenha volta. O que pode ser feito de fato é nos informarmos e estar sempre em busca do conhecimento, para que possamos reconhecer e nos proteger de aventureiros. CONHECIMENTO É PODER.
Neste momento estamos passando por um novo fenômeno, o de Babalawôs brasileiros. Inúmeros Babalorixá (sacerdotes de Orixás) estão “se tornando” Babalawôs (sacerdote de Orunmilá) e criando um novo conceito de religião que mistura o Candomblé com o RTY. O mesmo sacerdote com ambos ofícios.
Mas como isso foi acontecer ? Como os Babalawôs surgiram e estão se multiplicando no Brasil?
Vou tentar te explicar, espero que eu consiga.
A Religião Tradicional Iorubá em terras brasileiras aconteceu com a chegada de alguns Iorubás no Brasil entre as décadas de 80 e 90. Desta vez não como escravos e sim como sacerdotes que vieram estudar ou trabalhar por aqui. Pois bem, ao estabelecer residência por aqui eles também fundaram as suas próprias casas de louvor à orixá de acordo com a sua região de origem. Alguns desses sacerdotes tem como pilar o culto de Orunmilá. O sacerdote de Orunmilá é o Babalawô. Para tornar-se Babalawô é necessário fazer a iniciação em Orunmilá, que se chama Itefá. Neste ritual Ifá deve revelar que aquela pessoa tem o ODU de Babalawô. Após essa confirmação há uma série de outras prerrogativas ritualísticas e não ritualísticas, para que de fato um awo ifá possa se tornar um Babalawô, inclusive em algumas famílias há rituais que são feitos apenas na África.
Em minha família, um Sacerdote de Ifá é preparado desde criança para ser digno de carregar o nome de Orunmila. Ele precisa de vivência e convivência junto ao seu Oluwo (Babalawô que realizou a cerimônia de Itefá), ou de algum Babalawô daquele Egbé.
Um Babalawô em pleno exercício precisa de estudo para conhecer e memorizar todos os 256 odus, com no mínimo 4 versos de cada odu, o que corresponde ao mínimo de 1024 histórias, em que cada uma delas tem uma média de 3 páginas. Mais um detalhe, esse futuro sacerdote precisa dominar o idioma iorubá, não há escritos em português de confiança, por tanto a memória já faz uma pré-seleção dos futuros sacerdotes.
Um iorubá, ou uma boa parte dos que preservam suas tradições, dão menor importância ao caminho revelado e consideram sagrado e indispensável o estudo. Além de todos esses critérios não se pode esquecer do compromisso de viver de acordo com os mandamentos de Orunmila e compreender o que é ter o corpo, a alma e a nobreza de um awo.
Quantos anos você acha que isso demora?
Eu chuto uns 15 anos no mínimo se a pessoa não fala iorubá e sendo bem otimista 10 anos aos que já dominam o idioma.
E como há tantos brasileiros se tornando Babalawô?
Algumas famílias, inclusive famílias tradicionais de Yorubaland, dão o título de Babalawô para alguns iniciados após a revelação do odu no ritual do Itefá. Em pouco tempo esse novo Babalawô que não teve a vivência e o aprendizado que citei no parágrafo de cima, já começa a realizar iniciações em Orunmilá e dar o título de Babalawô para outros brasileiros. Daí em diante, o ciclo não tem fim.
Há também famílias que dão nome de Babalawo a qualquer iniciado homem, no entanto nestas mesmas famílias se exige um caminho longo entre o codinome Babalawô e um Babalawô com axé e prática o suficiente para praticar e levar o nome de Orunmilá.
Há Africanos que vendem títulos?
Sim. E a maioria deles nem ao menos cultuam os Orixás.
Somos uma nação com muitos problemas sociais, econômicos e culturais, somos potencialmente um povo fácil de ser enganado. Muitos de nós procura respostas espirituais para os nossos problemas, pois estamos em busca de um sussurro de esperança. Então o primeiro e mais convincente que nos ergue a mão já leva a nossa alma.
Quem dá poder e aval para essas pessoas nos enganarem somos nós com a falta de conhecimento.
Antes de assumir o compromisso com Orunmilá, saiba sobre a trajetória do Babalawô, procure saber sobre a sua origem, procure saber qual é o tipo de suporte que ele dará após a iniciação. Se possível conheça pessoas que foram iniciadas por ese sacerdote há mais de um ano.
Quem legitima o sacerdócio de Babalorixás, Iyalorixás e Babalawôs somos nós. Um Sacerdote sem seguidores não é ninguém. Um seguidor com conhecimento não legitima Sacerdotes despreparados.
Ire O
Ifásola Sówùnmí - Fê Aguiar
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